Declaração de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, sobre o Programa de ingerência e agressão ao povo e ao PaÍ­s

Jerónimo de Sousa    05.May.11    Outros autores

1. O pacto hoje revelado entre as entidades internacionais encarregadas de consumar o acto de ingerência externa e os partidos polÍ­ticos – PS, PSD e CDS-PP – que ambicionam, Í  sua sombra, encontrar justificação para prosseguirem o rumo de afundamento, empobrecimento e abdicação nacional, constitui um acto ilegitimo e antidemocrático.

IlegÍ­timo tanto no seu conteúdo como no seu significado polÍ­tico e institucional. Uma intervenção ilegÍ­tima, solicitada por um Governo limitado a meras funções de gestão e com a Assembleia da República dissolvida, que no seu conteúdo afronta e viola a Constituição da República.

Uma intervenção tão mais ilegÍ­tima quanto PS, PSD e CDS-PP pretendem, por via de uma inaceitável manobra de antecipação, criar factos consumados nas costas dos portugueses, quando os portugueses são chamados a decidir sobre o futuro do paÍ­s no próximo dia 5 de Junho.

Uma ilegitimidade que nenhuma manobra futura que os seus promotores tenham em vista ensaiar poderá disfarçar ou tornar legÍ­tima. A chamada “margem de manobra” ou a “contribuição positiva” que PSD e CDS-PP cinicamente invocam agora para justificar o seu apoio, não passa de um exercÍ­cio demagógico perante um pacote que, do ponto de vista estrutural e das suas principais opções, está definido em pormenor e cujas eventuais alterações serão no sentido de o agravar.

O PCP sublinha a particular gravidade de uma intervenção que – pelo seu significado, conteúdo e comprometimento futuro – constitui um verdadeiro golpe contra o regime democrático, a soberania de decisão do povo português e a independência nacional.

2. O PCP declara que, perante o anúncio destas medidas e deste entendimento ilegÍ­timos e ruinosos, o povo português tem não só o direito mas o dever de denunciar, não reconhecer e rejeitar aquilo que foi forjado e imposto pelo conluio entre o FMI, a União Europeia, o PS, o PSD e o CDS-PP.

Um direito e um dever que em 5 de Junho deve ser transformado em oportunidade de dizer Não! e contribuir para impedir, pelo voto popular, um pacto de submissão, retrocesso e abdicação que condena o paÍ­s, os trabalhadores e o povo português Í  pobreza, ao sub-desenvolvimento e Í  dependência extrema. Direito que o PCP assumirá pelo firme compromisso de inscrever na sua acção polÍ­tica a rejeição deste Programa de agressão e de cada uma das suas medidas gravosas.

3. O Programa de austeridade, retrocesso e miséria agora subscrito entre as duas troikas – a da imposição externa e a da submissão nacional – é a revelação e concretização plenas do que o PEC 4 apresentado pelo Governo em Março passado previa.
Um Programa que, para lá do descarado acto de dissimulação ensaiado pelo Primeiro-Ministro, constitui um acto sem precedentes na escalada de exploração, de venda do paÍ­s e de saque dos recursos nacionais.

José Sócrates anunciou ao paÍ­s o que não estava neste Programa porque quis esconder dos portugueses o que ele contém de declaração de guerra aos trabalhadores, aos seus direitos e rendimentos.

É preciso que se fale verdade aos trabalhadores, ao povo e ao paÍ­s.

O que lá está é a facilitação e embaratecimento dos despedimentos quando o que se impõe é criar emprego e combater a precariedade.

O que lá está é menos garantia de protecção no desemprego quando o que se impõe é assegurar protecção a centenas de milhar de famÍ­lias.

O que lá está é, de facto, o congelamento dos salários, incluindo do Salário MÍ­nimo Nacional, o congelamento e novos cortes no valor das pensões, o que significa a perda real de poder de compra, quando o que se impõe é valorizar os salários e as reformas para assegurar condições de vida dignas, combater a pobreza e dinamizar a economia.

O que lá está é a escandalosa tributação fiscal das prestações sociais quando o que se impõe é que se tribute a banca e as grandes fortunas.

O que lá está é o anúncio de um aumento brutal de encargos e de redução do rendimento disponÍ­vel para a generalidade das famÍ­lias com aumentos na factura da electricidade, nos bens essenciais, nos transportes e nos encargos com a habitação.

O que lá está é uma significativa penalização por via da carga fiscal, designadamente com a redução e eliminação das deduções no IRS de despesas com saúde, educação ou habitação.

O que lá está é o aumento das taxas moderadoras, o aumento dos medicamentos e a degradação dos cuidados de saúde, impedindo de facto o acesso a cuidados de saúde a centenas de milhar de portugueses, em particular dos mais idosos.

Todos estes sacrifÍ­cios que atingem o povo português não vão resolver qualquer problema do paÍ­s. São medidas que, segundo os seus próprios responsáveis, vão significar recessão económica ( quebra de 4%), com mais destruição da produção nacional. Com estas medidas Portugal em 2013 vai retroceder para nÍ­veis de há uma década atrás e o desemprego vai passar dos actuais 800 mil desempregados para próximo de um milhão em 2013.

O Primeiro-Ministro disse o que não estava no Programa mas escondeu, como escondem o PSD e o CDS-PP, quem são os beneficiários directos e o destino desse 78 mil milhões de euros que só acrescentarão mais endividamento e mais sacrifÍ­cios. Porque se o dissesse o paÍ­s ficaria a saber que parte dele (12 mil milhões) vão direitos Í  caixa da banca nacional, que a parte mais significativa nem sequer entrará no paÍ­s indo directamente para os bolsos daqueles que especulam com a dÍ­vida nacional e que, do que puder sobrar, mais de 35 mil milhões estão apresentados como garantia do Estado para os bancos.

Como bem sabem PS, PSD e CDS-PP o que não está no Programa são as medidas de taxação dos banqueiros, dos grupos económicos e das grandes fortunas. Pelo contrário, o que está no programa é: a drenagem directa de recursos do Estado para a banca; a preparação de uma alienação do BPN ao preço da chuva ficando o Estado com os cerca de cinco mil milhões de euros do seu passivo, depois de já lá ter enterrado mais de 2 mil milhões de euros; a entrega em bandeja ao grande patronato mão de obra barata e trabalhadores sem direitos e prontos a despedir; a alienação ao desbarato a favor do grande capital nacional e estrangeiro de importantes activos e empresas com um papel estratégico na economia nacional.

O que PS, PSD e CDS-PP não dizem e escondem é que este empréstimo se traduz em si próprio, pelos juros a ele associados, na continuação do processo de extorsão dos recursos nacionais, canalizando durante a próxima década verbas que atingirão dezenas de milhar de milhões de euros, conduzindo a uma situação insustentável.

É este o Programa de exploração, injustiças, empobrecimento e de declÍ­nio económico e social a que PS, PSD e CDS-PP deram o seu apoio. Um Programa que é sobretudo um milionário pacote de apoio e garantias a banqueiros e monopolistas, de entrega de recursos públicos para o bolso da agiotagem e especuladores nacionais e estrangeiros, que premeia e alimenta o processo de saque que os “mercados financeiros” lançaram sobre o paÍ­s, que aliena a independência nacional e o direito de Portugal a um desenvolvimento económico e social soberano.

4. A situação para a qual o paÍ­s foi arrastado não é obra de acaso. Tem na sua origem razões e responsáveis polÍ­ticos. É a consequência directa de 35 anos de contra-revolução revanchista, contra as conquistas e a Constituição de Abril. É a consequência de décadas de polÍ­tica de direita, conduzida por PS, PSD e CDS-PP, ao serviço do grande capital, da reconstituição do capitalismo monopolista e dos seus interesses. É a consequência do processo de integração capitalista da União Europeia profundamente lesivo dos direitos dos trabalhadores e do povo e entusiasticamente apoiado por PS, PSD e CDS-PP. Estes mesmos partidos que sobre os escombros da agenda de declÍ­nio e ruÍ­na que impuseram ao paÍ­s se reunem de novo, unidos agora num programa de venda e submissão do paÍ­s que , a não ser rejeitado pelos trabalhadores e pelo povo português, hipotecará por décadas o futuro de Portugal e dos portugueses.

Ao longo do processo o PCP rejeitou esta ingerência, denunciou a farsa da dita negociação, questionou o Governo sobre a real situação financeira e os compromissos assumidos e afirmou as suas propostas.

Há um caminho alternativo para vencer a dÍ­vida, promover o desenvolvimento, assegurar um paÍ­s soberano.

Um caminho baseado numa atitude patriótica de defesa dos interesses nacionais e de não abdicação perante o capital financeiro nacional e estrangeiro.

Um caminho que responde ao problema da dÍ­vida, exigindo a sua renegociação imediata – juros, prazos e montantes.

Um caminho que assume a prioridade da defesa, valorização e promoção dos recursos nacionais e da capacidade produtiva do paÍ­s (nas pescas, na agricultura, na indústria) e. em primeiro lugar, da defesa e valorização do mais importante recurso nacional – os trabalhadores.

Um caminho capaz de assegurar o desenvolvimento e o crescimento económico, que valorize os trabalhadores e os seus rendimentos, dinamize o mercado interno e a actividade das pequenas e médias empresas.

Um caminho que, afrontando os interesse do capital financeiro e dos grupos económicos, retome o controlo pelo Estado dos sectores estratégicos da economia nacional, afirme a subordinação do poder económico ao poder polÍ­tico e assegure o futuro independente e soberano de Portugal.

No momento em que se consuma um vergonhoso acto de submissão e abdicação levado a cabo em coordenação pela grande burguesia nacional e estrangeira, o PCP dirige-se a todos os portugueses apelando ao seu sentido patriótico, ao seu sentido de justiça, Í  sua determinação e para que, pela sua acção e pelo exercÍ­cio dos seus direitos constitucionais, expressem na luta e no voto o seu repúdio a este ataque contra Portugal e os portugueses.

Por mais condicionamentos e dificuldades que pretendam impor, o povo português não está condenado a um presente e a um futuro de dependência e submissão face aos interesses do grande capital e das grandes potências. O PCP reafirma a sua profunda convicção de que é possÍ­vel a abertura de novos caminhos de desenvolvimento soberano que, por ruptura com a polÍ­tica de direita, concretize uma nova polÍ­tica, patriótica e de esquerda ao serviço dos trabalhadores, do povo e do paÍ­s.

Gostaste do que leste?

Divulga o endereço deste texto e o de odiario.info entre os teus amigos e conhecidos