Passos, o entroikado

Henrique Custódio    30.Ago.16    Outros autores

«Passos Coelho já foi várias coisas na vida – aspirante a cantor lÍ­rico, frequentador de diversos cursos, finalmente titular de uma licenciatura granjeada aos 38 anos na universidade privada LusÍ­ada (apesar de tudo, mais expedito do que o seu amigo «doutor Relvas»), um ascenso polÍ­tico minucioso como presidente da jota PSD, finalmente presidente do partido, primeiro-ministro e de novo presidente, após ser inequivocamente afastado pelo eleitorado e um Governo PS tornado possÍ­vel na sequência das posições conjuntas assumidas com o PCP, PEV e BE».

Hoje, anda por aÍ­ a ressabiar desconfortos, ele, que tanto exortou a juventude portuguesa a «sair da zona de conforto» – coisa que, obviamente, o próprio não está disposto a fazer.

Reapareceu no Pontal, que há anos é no «calçadão» de Quarteira, tostado frente aos microfones, falando de improviso com papel Í  espreita, numa oratória pausada como de seu uso, fluente como a pausa induz e num discurso redondo que não aqueceu os dois mil comensais vindos em autocarros, pagos pelo partido, do Norte ao Sul e até da Madeira.

Aliás, no final ninguém percebeu que o homem tinha terminado a arenga e foi preciso Passos gritar várias vezes «Viva Portugal!» para a amodorrada plateia bater umas palmas para as televisões, entre digestivos. Disto fizeram testemunho várias reportagens, vá lá.

E que disse Coelho? O costume. Citou décimas de um relatório do INE escolhendo umas e escondendo outras, descobriu subidas «para o dobro» e descidas «para metade» na economia portuguesa compulsando umas décimas e exibindo-as como ouro de 24 quilates, continuando sem reparar que descidas ou subidas dumas décimas, em economia, são vacilações conjunturais e irrelevantes na computação da produtividade e desenvolvimento, que só corresponde a um aumento real a partir dos dois por cento (sendo que os dois por cento de feérico «aumento» corresponde a estagnação).

Provavelmente lá na LusÍ­ada, onde o licenciaram em Economia, ninguém se lembrou de lhe ensinar esta regra básica da economia capitalista (que, de resto, anda bastante esquecida entre os polÍ­ticos que para aÍ­ arrotam postas de pescada sobre economia e desenvolvimento, incluindo a professora de Passos Coelho na LusÍ­ada, Maria LuÍ­s Albuquerque).

Mas Passos Coelho também levou novidades ao calçadão, proferindo, Í s tantas: «[o Governo] também está esgotado socialmente porque esta troika governativa só sabe fazer o que é fácil – e depois do que é fácil acabaram-se as boas ideias».

Pelos vistos, agora Passos Coelho também acha «fácil» reverter os cortes em salários e pensões que o seu governo aplicadamente impôs, ainda acha que «depois do que é fácil» o actual Governo ficará «sem boas ideias» e descobriu, ó deuses! que até temos uma «troika governativa»!!!

Perdido no seu labirinto, o homem está definitivamente entroikado.

Este artigo foi publicado pelo jornal Avante! em 18.08.2016

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